Nas Terras das Brumas Ocultas - Reino dos Girassóis
- António Vilhena
- 7 de abr.
- 3 min de leitura

O Reino dos Girassóis deve seu nome às princesas Alizia e Aurélia, gêmeas, nascidas da mãe Rainha Gardência que contradisse os prognósticos dos adivinhos, feiticeiros e doutores de que de seu ventre nada resultaria.
O Rei Açude não cabia em si de felicidade e, claro, atendeu aos desejos manifestados pela mudança já que, Reino das Pedras Escuras não mais condizia com os novos tempos que se acreditava viriam, com o nascimento das princesas.
Na verdade, tratava-se de um reino diferente dos demais. Açude soube entender o que seus preletores lhe transmitiram e contrariamente a seus irmãos, resolveu desde cedo implementar mudanças, acreditar em dignidade e fazer com que os súditos para com quem tinha obrigações – assim pensava – (não devoção como os ainda arraigados e tradicionalistas cortesãos acreditavam) iniciassem um processo de mudança de forma a atingir uma vida diferenciada.
Com esse pensar conclamou sábios e letrados, doutores e humanistas, estivessem em que reinos fossem, para que, se assim o quisessem virem para o Reino dos Girassóis e nele participassem das mudanças advindas não só de suas ideias como de suas experiências, que após debatidas e aceitas pela maioria, sem que ele – Rei Açude pudesse exercer o direito de modificar ou alterar o proposto e aprovado.
Havia preocupações que ocupavam os primeiros lugares de uma longa lista que foi distribuída e afixada em todos os povoados. Como eram poucas as pessoas que sabiam juntar as letras e transformá-las em palavras, um escriba ficava junto ao local da fixação e informava a todos do que se tratava.
Cuidar do saber e do bem-estar; interferir na reputação de ser mulher e mãe; estar atento as colheitas e ao armazenamento; rever os caminhos e passagens, limpando-os ou alterando-os; pensar nas vendas e trocas; respeitar...
E assim ia falando o escriba, por vezes interrompido, por vezes aclamado, por vezes ignorado (sempre há os desinteressados que acabam por ser em menor número e normalmente se mostram insatisfeitos).
Açude e sua Gardi (na intimidade da alcova era esse o tratamento) sempre partilhavam dizeres tanto os ligados à corte quanto os que diziam respeito às mudanças propostas.
Passavam um bom tempo confabulando sobre os assuntos da Casa Real, principalmente no que dizia respeito às princesas Alizia e Aurélia.
Faziam gosto de vê-las crescer, folgando no meio dos girassóis, riso fácil, traquinas, cabelos cacheados, faces fagueiras e de olhares arguciosos. Afinal eram gêmeas!
A par disso não descuidavam da educação formal delas, constando boas leituras e escritas; bordados e o uso do tear; andar a cavalo e o exercício de defesa e ataque; e (suas altezas não abriam mão de conferir) da prática no respeito para com todos – pertencendo ou não à Casa Real.
Quanto as proposições, acompanhavam-nas com afinco e por vezes até com rigor. Não foram raras as vezes que almoços foram cancelados para dar lugar a viagens de verificação.
Por vezes Açude fazia-se acompanhar da Rainha Gardência e das princesas Alizia e Aurélia pois queria que a família (uma nova maneira) soubesse a quantas andavam as transformações.
As mudanças deveriam acontecer onde súditos estivessem, não importando a localização do povoado.
Dias, meses e alguns anos passaram.
- ‘Casas de livros’ e ‘burros desbravadores’ (assim eram chamados os animais que de povoado em povoado levavam livros e cadernos) eram um acontecimento.
- Dores manifestas tinham onde e por quem ser tratadas.

- A ‘Roda dos Expostos’ não era mais utilizada.
- Celeiros e armazéns estavam abarrotados de alimentos de tal sorte que enviados a outras terras propunham venda ou trocas.
- A cavalo, de carruagem ou de carroça transitava-se regularmente e sem percalços.
- Açoites e outros modos de punição não eram mais presenciados pois imperava o respeito e se de algum modo houvesse transgressões, penas cruéis não eram aplicadas.
- Fontes abasteciam homens e animais sem desperdício.
E os girassóis, ano após ano continuavam a sentir a presença de Alizia e Aurélia e seus movimentos indicavam a valorização e o respeito existentes.
E os girassóis, de encantos e enigmas continuavam em desafio para que o sol os mantivessem com o colorido que só as crianças – princesas ou não – sentem e veem.
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